Mas é claro que não, aquele dia não sairia como o planejado. Tudo desandou logo antes de acordar, tivera um pesadelo. Em seu triste sonho, o crush dizia-lhe que eram só amigos. O que a tinha chateado não era a ideia de estar na friend zone ou qualquer coisa do tipo, mas o fato era que na vida real sequer eram amigos.
Suas amigas sempre contavam de seus namoros online, ficantes e namorados que conheceram no tinder ou algo do tipo. Enquanto isso, ela sequer tinha coragem de olhar nos olhos ou dirigir a palavra ao seu vizinho. Ele devia achá-la extremamente mal educada, quando na verdade tudo que ela queria era dizer o quão bonito o achava. Que bela namoradeira, não?
Como se não bastasse a manhã já estar desalinhada -e triste-, descobrira que o açúcar tinha acabado. E o que somos sem açúcar nessa vida, não é mesmo? Seria clichê e impensável demais pedir um pouco no vizinho- pensou. Talvez pudesse deixar todos objetivos de lado e ir ao bar e na balada mais tarde, dançar e quem sabe sair com alguém... Mas não, por incrível que pareça, aquilo não a apetecia.
Ainda como se não pudesse piorar, estava entrando no quarto para se trocar bem quando bateu o dedão do pé no batente da porta. Isso mesmo gênio, quebra o dedo!-mordeu a língua. Assim não dá, sofrer por amor já é demais, agora se machucar por causa disso é o cúmulo do absurdo.- pensou. Tudo bem que ela sempre fora distraída, mas a atual desculpa era a paixonite.
Pensou por um instante naquele estranho conceito de amor. Ou não, ela não amava e mal estava apaixonada pelo vizinho, mas é aquele antigo jeito de falar. Amor está mais para sentimento incondicional e construído do que para uma atração. Paixão está mais para sentimento irracional e incontrolável do que para um simples química. Ela o queria, mas aquilo não era o fim do mundo.
Essa foi a sua constatação enquanto colocava gelo no dedão. Sua conclusão era que certas coisas não são para acontecer. Talvez ainda ela é quem fosse arcaica demais nesse mundo globalizado e moderno. Não é que ela não gostasse dele, só que não se encaixava. Sou uma peça fora do quebra cabeça!- constatou. Foi então que escutou a campainha tocando.
- E aí? Tudo bem? Eu reparei que você não saiu hoje. - Advinha quem era...
- Ah sim, hoje é meu dia de folga... - a voz saiu mirrada.
- É que estou com dificuldade em ter ideias para meu novo projeto e pensei em dar uma saída. Você topa tomar um café?
-Pode ser, tô sem nada para fazer mesmo!- deu de ombros.
Afinal, o mundo moderno talvez ainda tenha um pouco de espaço para o velho romance..."
Giovana de Carvalho Florencio