terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Romances Modernos

Resultado de imagem para açucar na mesa"A vida é feita de momentos. Carolina sabia muito bem disso quando resolveu tirar aquele dia só para si. Há quanto tempo não sentava sozinha para ler um livro ao som de sua música favorita? Ou até mesmo dançar sem se importar com o ritmo, os passos ou julgamentos? Estava de folga, ou seja, além de viável aquele dia era mais do que merecido.
Mas é claro que não, aquele dia não sairia como o planejado. Tudo desandou logo antes de acordar, tivera um pesadelo. Em seu triste sonho, o crush dizia-lhe que eram só amigos. O que a tinha chateado não era a ideia de estar na friend zone ou qualquer coisa do tipo, mas o fato era que na vida real sequer eram amigos.
Suas amigas sempre contavam de seus namoros online, ficantes e namorados que conheceram no tinder ou algo do tipo. Enquanto isso, ela sequer tinha coragem de olhar nos olhos ou dirigir a palavra ao seu vizinho. Ele devia achá-la extremamente mal educada, quando na verdade tudo que ela queria era dizer o quão bonito o achava. Que bela namoradeira, não?
Como se não bastasse a manhã já estar desalinhada -e triste-, descobrira que o açúcar tinha acabado. E o que somos sem açúcar nessa vida, não é mesmo? Seria clichê e impensável demais pedir um pouco no vizinho- pensou. Talvez pudesse deixar todos objetivos de lado e ir ao bar e na balada mais tarde, dançar e quem sabe sair com alguém... Mas não, por incrível que pareça, aquilo não a apetecia.
Ainda como se não pudesse piorar, estava entrando no quarto para se trocar bem quando bateu o dedão do pé no batente da porta. Isso mesmo gênio, quebra o dedo!-mordeu a língua. Assim não dá, sofrer por amor já é demais, agora se machucar por causa disso é o cúmulo do absurdo.- pensou. Tudo bem que ela sempre fora distraída, mas a atual desculpa era a paixonite.
Pensou por um instante naquele estranho conceito de amor. Ou não, ela não amava e mal estava apaixonada pelo vizinho, mas é aquele antigo jeito de falar. Amor está mais para sentimento incondicional e construído do que para uma atração. Paixão está mais para sentimento irracional e incontrolável do que para um simples química. Ela o queria, mas aquilo não era o fim do mundo.
Essa foi a sua constatação enquanto colocava gelo no dedão. Sua conclusão era que certas coisas não são para acontecer. Talvez ainda ela é quem fosse arcaica demais nesse mundo globalizado e moderno. Não é que ela não gostasse dele, só que não se encaixava. Sou uma peça fora do quebra cabeça!- constatou. Foi então que escutou a campainha tocando.
- E aí? Tudo bem? Eu reparei que você não saiu hoje. - Advinha quem era...
- Ah sim, hoje é meu dia de folga... - a voz saiu mirrada.
- É que estou com dificuldade em ter ideias para meu novo projeto e pensei em dar uma saída. Você topa tomar um café?
-Pode ser, tô sem nada para fazer mesmo!- deu de ombros.
Afinal, o mundo moderno talvez ainda tenha um pouco de espaço para o velho romance..."
Giovana de Carvalho Florencio

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

La La Land

Qual filme escolher para a primeira crítica de 2017?  Eu havia pensado em uma lista de bons filmes, mas depois de ir ao cinema, precisei deixar todos eles de lado. A pergunta correta então, seria: Ah, claro, como não falar de La La Land? Há um bom tempo que nenhum filme me deixava encantada e apaixonada desse jeito. Tudo nesse longa parece funcionar muito bem, então, tentaremos humildemente fazer uma breve análise sobre os acertos da obra.



Data de lançamento: 19 de janeiro de 2017
Direção: Damien Chazelle

Duração: 2h 08min 
Gênero: Comédia Musical, Romance
Nacionalidade: EUA
Sinopse:
Ao chegar em Los Angeles o pianista de jazz Sebastian (Ryan Gosling) conhece a atriz iniciante Mia (Emma Stone) e os dois se apaixonam perdidamente. Em busca de oportunidades para suas carreiras na competitiva cidade, os jovens tentam fazer o relacionamento amoroso dar certo enquanto perseguem fama e sucesso.
Opinião:
Resultado de imagem para la la land cartaz
Se há algumas semanas me dissessem que o melhor filme do ano seria um musical, que Ryan Gosling ganharia o Globo de Ouro ( e quem sabe o Oscar), que Emma Stone surpreenderia mais ainda e que eu iria chorar no cinema, eu provavelmente riria. Mas agora sou obrigada a dar o braço a torcer. La La Land além de surpreendente, é uma das melhores obras já feitas no cinema dos últimos anos. Não é só pela trama, ou pelas músicas, atuação, cores e coreografias, é por tudo isso junto. 
Já faz alguns meses que soube dessa produção e assisti o trailer. Digo com sinceridade que o mesmo não me convenceu, logo eu que sou um pé atrás com musicais. Porém, devido a maciça propagando em cima do filme, o Globo de Ouro e um empurrãozinho dos meus amigos precisei ir contemplar a obra logo na pré-estreia. Não me arrependo nem um pouco, até porque estou cantando a trilha sonora até agora. Mas vamos começar a falar do enredo...
A sequência inicial do filme produz um sentimento controvertido, há quem ame, quem se incomode ou quem fique dividido como eu. Os primeiros minutos contemplam a música mais chiclete do filme em que meio a um engarrafamento, as pessoas descem de seus carros para cantar e dançar. Um bom simbolismo, uma ótima música e eu com medo de que filme não fosse orgânico o suficiente. Porém, pode ficar tranquilo, depois disso a trama começa de verdade e tudo passa a se encaixar. 
Quando somos apresentados a Mia, aspirante a atriz, já nos sensibilizamos com seu sonho aparentemente tão distante e pela exímia atuação de Emma Stone. Logo em seguida, conhecemos Sebastian, o pianista sonhador, o qual deseja reerguer seu restaurante regado ao som de Jazz. Tipo musical que ele acredita estar morrendo. Possuindo uma queda por Jazz me senti convencida pela trama nesse momento, e de fato é então que a história engrena.
O destino parece unir esses personagens, e nós espectadores poderemos observar o seu relacionamento com toda sensibilidade e detalhes em suas estações. Pretendo não dar mais detalhes para te instigar. Sabe então o que de melhor também a trama possui? O contexto da "cidade das estrelas", do mundo da fama e sobre música. Além da obra ser recheada de boas músicas, cores fascinantes que se combinam perfeitamente e uma câmera bem direcionada nos detalhes. Ressalto ainda minha surpresa com a boa atuação, inclusive na música de Ryan Gosling. Esse detalhe me faz lembrar de uma das mensagens do filme, muitas vezes há pessoas talentosas que precisam apenas de uma oportunidade.
O final espetacular quebra muitos paradigmas do cinema e traz um realismo tocante. Damien Chazelle, o jovem diretor, acaba de consolidar seu espaço no cinema e abrir portas para novos filmes, cheios de intertextualidade, criatividade e verossimilhança. Agora, sinceramente, fora toda essa análise cinematográfica, o longa é tocante e dá vontade de sair do cinema cantando e dançando. Se voce não assistiu, ainda há tempo.
"Para os sonhadores que acreditam no amor
E para os apaixonados que acreditam em sonhos"

sábado, 14 de janeiro de 2017

A Eterna Incompreensão de Viver

Uma das analogias contidas no livro "O Mundo de Sofia" é sobre o Coelho da Cartola. Esse é o universo que vivemos. Como explicar o aparecimento e saída do Coelho da Cartola? É uma das indagações que temos na vida.  Nascemos na pontinha dos pelos com a capacidade de nos maravilhar e refletir sobre o mundo, mas com o tempo vamos escorregando para a base da pelagem aonde mal podemos ver o que há além. Confortáveis demais para ousar subir de novo. Mas pensando, refletindo, filosofando podemos escalar lentamente até  a pontinha dos pelos, para enfim poder ver um pouco do mundo. Pois é, assim como somos incapazes de ver o mundo em sua completude e tudo que podemos ver é com muito esforço, também somos incapazes de ver outras pessoas em tudo que são.
Alguma vez alguém me disse que você poderia viver com uma pessoa a sua vida toda e nunca conhecê-la realmente. Pois bem, a meu ver, somos seres eternamente incompreendidos. E não, isso não é papo de adolescente, apenas é a mais fatídica realidade. do existir. Apesar desse discurso parecer meio niilista ou deprimente, quero informar que entender isso foi o grande triunfo na minha vida pessoal, e já lhe explicarei o porquê.
Quando somos crianças sentimos constantemente a necessidade de nos fazer compreendidos, tal questão leva a sérias crises na adolescência. Digo isso por uma perspectiva particular de observação do mundo que me cerca. Aliás, quem é que no fundo não quer se sentir compreendido pelo mundo? Ninguém gosta de se sentir rejeitado, renegado, ser debochado ou ignorado. "All You Need Is Love" - Já diziam os Beatles.
Mas a questão é bem mais profunda do que aparenta. Não é como se o problema fosse seu pai, sua mãe, seus amigos, seu cachorro, periquito ou papagaio. O xis da questão está no fato de que mesmo com os vários tipos de linguagens, somos incapazes de expressar tudo o que sentimos. É por isso que tentamos nos fazer entendidos de todas as maneiras possíveis, através da dança, música, artes plásticas, escrita, gestos e atitudes. Parece-me que algo no nosso âmago nos impele a nos relacionarmos com o mundo. Porém, muitas das vezes sequer somos capazes de nos comunicarmos conosco mesmo. 
Não parece curioso a preocupação tão incidente sobre a inteligência intrapessoal abordada pelos materiais de autoajuda? Reflita comigo um pouco: sequer somos capazes de nos enxergar por fora como somos, o que vemos sempre são reflexos e rascunhos de nós mesmos, quiça conheceríamos todo nosso interior. Menos provável ainda é que entendamos tudo que passa pela cabeça dos outros!
Estamos fadados a essa eterna incompreensão de viver. Nunca sabemos tudo sobre nós mesmos, nenhuma pessoa saberá sobre nós e no final das contas não somos tão previsíveis assim. 
Saber disso nos ajuda a ser mais empáticos com os outros, porque eles tem dificuldades e são gente como a gente. Também nos faz cobrar menos de nós mesmos, para nos aceitarmos como somos, sabe, como diz o ditado "A beleza está nos olhos de quem vê." Aquele aparente defeitinho seu pode ser o que mais agrada a outra pessoa. No fim das contas, sermos eternamente incompreendidos pode ser bastante fascinante, mais do que aterrorizador. Porém, assumo, ainda estou aprendendo a me maravilhar mais do que me assustar.

sábado, 7 de janeiro de 2017

Resenha- O Palácio de Inverno

O Palácio de Inverno
Comecei o ano de 2015 com uma excelente recomendação de livro. Este mesmo o qual iniciei 2016 lendo e começo 2017 recomendando. O Palácio de Inverno é aquele livro que tem tudo o que aprecio: história com contexto histórico, se passa na Rússia ( país o qual me chama muita atenção em termos históricos), trata de temas delicados e possui um brilhante escritor. John Boyne já é famoso por "O menino do Pijama Listrado". Caso tenha se interessado sinta-se convidado a ler essa resenha.

Editora: Companhia das Letras
Páginas: 456
Ano: 2010

Sinopse: Pode-se fugir da história? Será possível viver no anonimato após uma existência de fausto e glória? A vida comum é assim tão diferente da vida pública? Geórgui Jachmenev passou a vida inteira se debatendo com essas questões, e agora, prestes a perder o grande amor de sua vida, tenta encontrar uma resposta para elas ao refletir sobre seu percurso num século XX que sempre lhe pareceu longo demais.
Seus feitos começaram cedo: aos dezesseis anos, em ação impulsiva e atabalhoada, o rapaz impediu um atentado contra a vida de ninguém menos que o grão-duque Nicolau Nicolaievitch, irmão do czar Nicolau II, que, agradecido, nomeou Geórgui o guarda-costas oficial de seu filho Alexei, destinado a ser o próximo czar. Uma reviravolta impressionante, que o levou da taiga russa para o fausto dos palácios moscovitas, cenário que, apesar da amplidão e luxo de seus imensos corredores, iria se revelar bem mais inóspito que os frios grotões de sua vida anterior.
A dura experiência com esse mundo gélido de intrigas palacianas, às quais sempre era jogado contra sua vontade, e de grandes tensões e responsabilidade só foi apaziguada com a chegada do primeiro amor, Zoia. Mas os tempos eram agitados, e a história deixou pouco espaço para idílios: quando a Revolução Bolchevique tomou de assalto o país, e isolou toda a família do czar numa casa de campo nos arredores de Ekaterinburg, mais uma vez Geórgui teve de agir rápido a fim de salvar a si e a Zoia. A vida com ela lhe custaria pátria, família e prestígio, e ele jamais se arrependeu disso - mas e para Zoia, o que teria custado?
Numa narrativa fascinante, em que presente e passado vão convergindo em capítulos alternados, da Inglaterra dos anos Thatcher para a época dos czares russos, e dos anos difíceis da Segunda Guerra Mundial para o turbilhão da Revolução Bolchevique, acompanhamos Geórgui em meio a acontecimentos históricos decisivos que acabam por se revelar mero pano de fundo para uma história de amor que esconde um grande mistério, talvez maior mesmo que a própria história.

Sobre o Livro: Não é preciso ser fã de romances históricos para achar palácios, princesas, reis e guerras algo interessante. John Boyne parece ter talento de abordar essas temáticas e deixá-las mais leves, e ainda carregadas de lições. Intercalando passado e presente, nosso autor conta a vida de Geórgui do ponto de vista da juventude e velhice, uma de foma crescente  e outra decrescente, até que se encontrem.  O melhor de tudo é que no contexto geral cada detalhe da obra se soma até desembocar no incrível final. 
O final realista e sensível está dentro dos fatores da obra que tornaram-na ainda mais complexa e valiosa. Ao mesmo tempo que podemos ver a doçura da juventude,da esperança e do amor na fase jovem do protagonista, encontramos o realismo e as fatalidades da vida em sua fase adulta. O conceito final de solidão é de arrepiar do dedão do pé a ponta do cabelo. Durante 2016 pude refletir e interiorizar essas mensagens em minha vida.
Quanto a narrativa, por sua vez, vemos a história de Geórgui em sua juventude escolhendo e sendo escolhido pela vida para servir a família real, como guarda costas do frágil príncipe Alexei no palácio junto ao Czar e toda família real. Mal sabia ele, mas toda essa mudança mudaria sua vida para sempre. De forma orgânica vemos a derrocada do império Russo e a ascensão da URSS, com direito a presença da Primeira Guerra Mundial, o temido Rasputin e a transformação de São Petersburgo em Petrogrado e por fim em Leningrado.
Na outra fase, simultaneamente, observamos a velhice e as doenças dessa, a preocupação com a morte, depressão, filhos e relacionamento conjugal entre Geórgui  adulto e sua companheira da vida Zoia. Ainda o que não poderia faltar, é a paixão que o protagonista vai criando pela literatura e como a vida dentro das bibliotecas também influencia sua vida de forma maravilhosa. O melhor de tudo: Vemos a vida como ela é, cheia de altos e  baixos.
Esse livro é daqueles bem construídos, com bons personagens, um enredo envolvente e impactante. Eu tenho o hábito de recomendar os livros que gosto, porém, dessa vez quero mais do que recomendar, quero pedir encarecidamente que não perca a oportunidade de ler esse autor nessa mais belíssima obra. Mais do que uma aula de história, "O Palácio de Inverno" é uma lição de vida, sem moralismos, nua e crua. Depois de tudo, sobra só um desejo: um dia quero conhecer o "Palácio de Inverno" nas noites brancas com esse livro nas mãos.