terça-feira, 15 de novembro de 2016

Resenha- Sal

Sal, é literalmente aquele livro que vem para salgar, para colocar sal nas feridas e deixar arder. São poucos os livros que me bagunçam desse jeito, com essa intensidade, mas Sal conseguiu. Ainda sim, devo alertar, esse não é livro para ler sem tempo, sem atenção. Não, para lê-lo é preciso de sensibilidade, muita sensibilidade e tempo e calma. Abra sua mente e sente para salgar um pouco a vida.Sal
Editora: Intrínseca
Ano: 2013
Páginas: 240

Sinopse: Um farol enlouquecido deixa desamparados os homens do mar que circulam em torno da pequena e isolada ilha de La Duiva. Sob sua luz vacilante, a matriarca da família Godoy reconstitui as cicatrizes do passado. Em sua interminável tapeçaria, Cecília entrelaça as sinas de Ivan, seu marido, e de seus filhos ausentes, elegendo uma cor para cada um.

Com uma linguagem poética, a premiada escritora gaúcha Leticia Wierzchowski, autora de A casa das sete mulheres, dá voz e vida a cada um dos integrantes da família Godoy, criando uma história delicada e surpreendente, enriquecida por múltiplos e divergentes pontos de vista.
Sobre o Livro:
Nunca pensei na vida como tecida por moiras ou algo do tipo. Talvez em alguns momentos específicos tenha acreditado em destino, mas de forma geral sempre acabo chegando ao “carpe diem”. Sal por sua vez foi um livro que se valeu da ideia de destino e até um pouco de mitologia grega para tecer a sua história.
Isso mesmo, tecida pela matriarca da família Godoy, a tapeçaria em suas diversas cores conta a história da dispersão dos seis filhos de Cecília pelo mundo. Paralelamente a isso, vemos trechos do livro de Flora, mola propulsora de toda história e uma parte narrada especialmente por Tiberius, o caçula e vidente da família. Como tudo isso pode contar uma só história?
Bem, na pequena ilha de La Duiva há um farol, farol que auxilia na viagem dos marinheiros e parece estar vivo junto a essa família. Ele será o local aonde o amor de Cecília e Ivan vai florescer até o nascimento de seus seis filhos, Lucas, Julieta, Orfeu, as gêmeas Eva e Flora e Tiberius.
Lucas é o mais parecido com o pai, muito sério, trabalhador e também se assemelha a esse fisicamente.  Só irá mudar seu posicionamento quando se apaixonar e mostrar que é adulto para fazer suas próprias escolhas. Sinceramente, a meu ver esse é um dos personagens mais simples da obra, o que não quer dizer que seja desinteressante, apenas é bem transparente, porém, ainda consegue ser agradável.
Julieta foi uma personagem que me despertou a curiosidade, apesar de não aparecer tanto e narrar apenas um capítulo. Não fica claro na obra, mas parece que Julieta tem alguma doença, tal como paralisia, que a impede de andar e se comunicar, isso não quer dizer que seu cérebro não funcione. Como pode se ver pelos comentários de Orfeu sobre o medo dela quanto à imagem da falecida e maldosa avó. É essa doçura que sentimos com a narração dessa personagem, é como um sinal “Eu estou bem aqui”. Maravilhoso!
Orfeu por sua vez é aquele personagem que vai se mostrando sorrateiramente, mas acaba por se tornar um dos pilares da obra.  Sensível, apegado a Julieta, amante de poesia e confidente da irmã Flora, o irmão do meio participa da grande reviravolta do livro. Chegou um momento da história em que não sabia o que pensar dele. Não conseguia sentir raiva, porque ele era muito interessante, mas a sua complexidade o leva a ter atitudes que nos conduzem a um conflito interno. No final das contas, não consegui deixar de me apaixonar por ele.
Eva, gêmea de flora, a garota dos cabelos de fogo tão diferente da irmã. É aquela que podemos chamar de “prafrentex”, namora muito e sabe de muitas coisas da vida para uma jovem em uma vila durante os anos 80. Não sei se pela narração não ter sido imparcial, Eva pouco aparece na trama e quando aparece é narrado pela mãe, Flora ou Tiberius, que não tinham apego a ela. A personagem parece ser linear demais. Talvez por ser a única personagem sem grandes conflitos da obra e que fica quando todos vão embora.
Flora, ah, Flora, como não se identificar com ela? Escritora, leitora assídua e apaixonada, mal sabia que ao escrever seu primeiro romance redigia toda a história de sua família. Quando recebeu a visita do professor Julius, o qual lera e se encantara com sua obra, criou a esperança. Essa é a personagem mais sonhadora e não deixa sua identidade nem um segundo, sempre faz tudo a sua maneira. 
E por fim, Tiberius, o jovem e sofrido Tiberius. O rapaz aparece pouco no começo, mas vai tomando uma posição sem precedentes ao longo do livro. Desde muito novo era amante das estrelas e podia sentir o futuro, nessa ambiente místico, nosso jovem tenta solucionar os conflitos que surgem na família Godoy e termina como o pouco de esperança que resta na vida.  Mesmo quando, devastado, passa por momentos muito ruins em que chega a bloquear tudo com a bebida. No remate do livro, só queria que ele estivesse ali para dar-lhe um abraço.
Entre as histórias, ancestrais da família Godoy, as diversas personalidades dos irmãos temos tecida a história do mundo. É fácil identificar várias pessoas dentro da trama, todos temos um pouco de cada personagem, mesmo que uns sejam mais lineares que os outros.  Vemos com a chegada do professor Julius apenas o “start” do processo de independência dos personagens. Triste ou feliz, Sal traz a realidade a tona envolta por mistério e um pouco de imaginação. E muitas, muitas lágrimas. Curioso e instigante, Sal é mais um ponto positivo para a literatura nacional.
Uma família é como uma constelação... Numa noite escura, andando pela praia, uma pessoa pode enxergar entre mil e mil e quinhentas estrelas. Existe muito delas lá no céu brilhando através do tempo, mas são invisíveis a olho nu. Aqui embaixo, não podemos vê-las com os nossos olhos. Mas elas estão lá.” WIERZCHOWSKI, Letícia. Sal, pág.79.



segunda-feira, 7 de novembro de 2016

O Amor é Racional

Esse é aquele momento em que você, meu caro leitor, deve estar pensando 'Que poeta mais de meia tigela é esta', não é mesmo? Mas primeiro, deixe me esclarecer; O amor é racional, porém isso não quer dizer que ele é racionalizável. Calma, vou explicar melhor.
Vamos começar dizendo o básico. Essa ideia de amor romântico e pessoa certa tem atormentado o ser humano há séculos e séculos. Amor e casamento estão atrelados? É preciso amar para ser feliz? Com quantos anos vou me casar? Quando vou me apaixonar? E esse monte de perguntas que todos um dia já nos fizemos. Ou pelo menos ouvimos alguém fazer.
Agora vamos dizer porque o amor é racional. Oras bolas, um homem e uma mulher (ou as variações disto) olham um para o outro e dizem 'Eu te amo', verdadeiramente. Isso não pode ser pouca coisa, não é? Tem de haver algum motivo para acontecer. Eles não simplesmente acordaram de manhã e falaram 'Vou amar aquela pessoa' e feito. Talvez ele (ou ela) até possa ter dito 'Vou amar aquela pessoa', mas ele já tinha alguma razão para amá-la. Seja aquele sorriso, aquele riso, aquela cabecinha ou qualquer outro atrativo que tenha visto nela. Se você pensa que há uma força maior que nos direciona para essa decisão, ótimo. Se você pensa que há razões bioquímicas para isso, ou atrações cognitivas ou qualquer coisa do gênero, ótimo também. Mas entenda, não estou impondo essa ideia, apenas constatando. O amor é racional. Mesmo que seja seu inconsciente que te direcionou a ele.
Agora por outro lado, o amor não é nada racionalizavel. Poetas, filósofos, teólogos e cientistas em geral tem tentado explicar o amor e falhado. Podemos até encontrar uma razão para ele acontecer. Mas não conseguimos explicá-lo como sentimento. Como explicar aquela temperança mesmo quando você está com raiva do ente amado? Ou ainda, como explicar o sorriso besta que aparece na sua cara quando vê sua bela silhueta ou quando conversa sobre poesia, ou quando assistem sua série favorita abraçados?
Sabemos que esse sentimento tem uma razão, só não sabemos esmiuça-lo. Agora, qual a utilidade de saber isso? Simples, pare de se culpar por amar alguém ou por nao conseguir amar outra pessoa. Amor é amor. Mas falando sério, você não vai ficar pensando nisso quando tiver deleitado nos braços da amada ou do amado, né?

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Vermelho

Eram duas da manhã. Chovia lá fora. Chovia, não, o mundo desabava. Só ela, só seu corpo não desabava na cama. A mente estava atormentada demais para reagir. Os problemas no trabalho a assombravam mais do que qualquer coisa. Tanto que ela nem percebeu que já era 31 de Outubro. Só se recordou quando ligou a Televisão e passava um filme sobre vampiros: "Especial de Halloween". 
Deu de ombros e foi tomar um banho frio. Se dormir não dava certo, seria melhor trabalhar de madrugada então, tinha muitos relatórios a escrever. Naquele Dia das Bruxas se ela não fosse produtiva, bruxas, vampiros e fantasmas seriam seus menores problemas. Perdoem-me pelo trocadilho, mas as bruxas do escritório estavam à solta.
Assim que entrou no banheiro e tirou a roupa, se olhou no espelho. Estava mais magra do que nunca, esse emprego estavaa matando aos poucos. Os seios mirrados e as costelas quase a mostra indicavam um início de desnutrição. Foi então, perdida em seus pensamentos que ouviu o barulho, risadas e gritos. O vento soprava em sua janela. Não, devia ser coisa de sua cabeça. Mas ainda assim, era Halloween.
Direcionou-se ao chuveiro. Girou três quartos da torneira quando sentiu a água tocar sua pele. Fechou os olhos para sentir o toque sereno nas costas. Como gostava daquela sensação. Foi então, quando abriu um pouco as pálpebras que viu. A água. Vermelha. Sangue.
Um grito horrendo e agudo saindo de sua boca. As mãos tremulas fechando a torneira e puxando a toalha. Tudo sujo de vermelho, aguado. O Sangue misturado com água. Caixa da água. Gritos. Madrugada. Morte?
Abriu a torneira. Vermelha. O filtro. Límpido, mas sabe-se lá. A descarga. Vermelha. Não podia ser. Ou poderia? Tomou coragem e foi tirar tudo a limpo. Fosse o que fosse. Desceu as escadas com as roupas vermelhas. Contou o ocorrido ao porteiro. As pernas do moço tremiam como vara verde. "Oh, minha nossa, e se tiver alguém morto na caixa da água...". "Só há um jeito de descobrir."
Ambos subiram as escadas, temerosos. Ao chegar no terraço o moço pediu para voltar. 'Não, vamos até o fim". Eles subiram as escadinhas que levavam a abertura da caixa. Abriram o tampo com os olhos arregalados. Ali estava!
A água vermelha, mas nenhum corpo. Ninguém tinha morrido. Aparentemente. Desceram as escadas, aliviados. Mas confusos. Porque então a água estaria vermelha? Confusos e já saindo avistaram o lixo, por acaso ela enxergou os frascos, corantes- sangue falso. Uma peça. Alguns jovenzinhos haviam lhe pregado uma peça. Deu uma gargalhada alta e imponente. Estava tudo bem de novo.
Já estava em casa, ainda irritada com a ausência de água. Porque só no dia mais tarde toda caixa da água seria filtrada e os causadores investigados, segundo o síndico. Vermelho. Sua cor predileta. Que ironia, não? Então um morcego pousou no umbral de sua janela. Ela apenas riu. "Ultimamente tenho percebido que não é a morte que mais apavora, mas a vida. Ah, essa sim me apavora!"
Giovana de Carvalho Florencio

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Up - Altas Aventuras

Esse filme é tão amorzinho que eu poderia assistir uma, duas, três, quantas vezes fosse ao infinito e além! Ainda no clima do mês das crianças vamos falar sobre um filme infantil indicado para todas as idades. O mais gostoso de Up é como vemos a história sendo contruída, da infância à velhice. Mas vamos com calma, falaremos sobre isso mais adiante.

Data de lançamento: 4 de setembro de 2009
Duração: 1h 35min 
Gênero: Animação, Família
Nacionalidade: EUA
Sinopse: Carl Fredricksen (Edward Asner) é um vendedor de balões que, aos 78 anos, está prestes a perder a casa em que sempre viveu com sua esposa, a falecida Ellie. O terreno onde a casa fica localizada interessa a um empresário, que deseja construir no local um edifício. Após um incidente em que acerta um homem com sua bengala, Carl é considerado uma ameaça pública e forçado a ser internado em um asilo. Para evitar que isto aconteça, ele enche milhares de balões em sua casa, fazendo com que ela levante vôo. O objetivo de Carl é viajar para uma floresta na América do Sul, um local onde ele e Ellie sempre desejaram morar. Só que, após o início da aventura, ele descobre que seu pior pesadelo embarcou junto: Russell (Jordan Nagai), um menino de 8 anos.

Opinião: A história dos dez primeiros minutos de filme conta sobre um lindo amor entre um casal, Elle e Carl. Ela uma menina tagarela, ele um menino tímido, ambos sonhadores. Eles se conhecem acidentalmente na infância e começam uma bela amizade a partir do sonho de seres exploradores. Inspirados pelo grande explorador Carles Muntz, sonham em visitar o Paraíso das Cachoeiras e viverem grandes aventuras. Já adultos casam-se e constroem uma bela vida juntos, sempre na tentativa de juntar dinheiro para suas viagens. Porém, com os imprevistos da vida, acabam nunca conseguindo realizar esse desejo. Quando já idosa Elle se vai, Carl passa a se sentir cada vez mais sozinho e perturbado com a ideia de nunca ter realizado o sonho de sua amada. É então que ele conhece um pequeno explorador da natureza, Russel. O sonho do pequeno é ganhar a medalha que lhe falta: ajudar um idoso, para participar da cerimônia de premiação na qual se tornaria um "Grande Explorador". Na tentativa de ajudar o menino Carl pede-o para este capturar um animal que cercava sua casa. Ao mesmo tempo um empresário tenta comprar a casa para construir seus prédios no lugar. Estando para ser transferido a um asilo, nosso caro senhor tem uma ideia, viajar com a sua casa elevada por balões. 
É nesse universo lúdico que Carl e o pequeno Russel chegam ao Paraíso das Cachoeiras, aonde vão encontrar o feroz explorador Muntz (o qual teve seu nome desacreditado por não apresentar o pássaro das cachoeiras vivo), seus cães falantes e o pássaro raro pelo qual Muntz tenta capturar. A reviravolta na história junto à delicadeza com a questão sentimental dos personagens, Russel e seus problemas familiares e Carl lidando com a morte de Elle, são o melhor da obra. Não tenho dúvidas ao dizer que Up é uma das melhores animações da Pixar dos últimos anos.
Carl e Russel são personagens que se completam. Carl que nunca teve filhos e Russel tem o pai sempre ausente. O humor e o drama dos personagens se completam melhor do que queijo com goiabada. É fascinante poder encontrar uma perfeita fusão da vida em uma animação "infantil" de menos de 100 minutos. Fora o quesito da imagem, as cores, o desenho e o recorte das cenas todos perfeitamente produzidos. Up é daqueles filmes que não se tem o que se falar mal, recomendado para todos e eternizado em nossas memórias.

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Sobre crescer: Depende!



Os pezinhos balançam no ar
Tic Tac, Tic Tac, as horas a correr
A cabeça está a imaginar
Um desculpa pra uma brincadeira
Qualquer que seja, qualquer bobeira
Quer dançar, quer sonhar, quer...

Ah, será que ser adulto é tão bom?
- Já lhe respondo: depende-
Hm... Vai demorar muito para eu crescer?
- Mais uma vez: depende-
Como eu vou saber que cresci?
- Bem, ainda assim, depende-

Ser criança é ter todo um futuro pela frente
É poder sonhar e se alegrar com um bombom
Ah, mas gente grande ou pequena tem de aprender
Viver é viver, a felicidade está nas coisas pequenas
Sinto cada dia mais saudade depois que cresci
Aquela menina vive e viverá, apenas diferente

Porque tudo simplesmente depende?
Ah, meu caro leitor, isso não sei eu
Só sei que não sei, que a criança é
O puro ser cheio de expectativas
Mas enquanto crescemos sabemos
Que viver é isso, ser criança e ser crescido

Giovana de Carvalho Florencio

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Resenha "A Bolsa Amarela"

É mês das crianças! E nossas programações estão recheadas da doçura e das lembranças de infância. Agora, te pergunto: Como falar desse livro que simplesmente mudou a minha vida? Dê a uma criança de 11 anos um bom livro e um pouco de esperança e verá o nascimento de um escritor. Além de uma grande inspiração para minha vida pessoal, "A Bolsa Amarela” foi o ponta pé inicial para minha trajetória literária. Então vamos falar um pouco dessa belezura.


Editora: Casa Lygia Bojunga
Ano: 2008
Páginas: 140
Sinopse: A BOLSA AMARELA é a história de uma menina que entra em conflito consigo mesma e com a família ao reprimir três grandes vontades (que ela esconde numa bolsa amarela ) - a vontade de ser gente grande, a de ter nascido menino e a de se tornar escritora. A partir dessa revelação - por si mesma uma contestação à estrutura familiar tradicional em cujo meio "criança não tem vontade" - essa menina sensível e imaginativa nos conta o seu dia-a-dia, juntando o mundo real da família ao mundo criado por sua imaginação fértil e povoado de amigos secretos e fantasias. Ao mesmo tempo que se sucedem episódios reais e fantásticos, uma aventura espiritual se processa, e a menina segue rumo à sua afirmação como pessoa.

A BOLSA AMARELA foi traduzido em vários idiomas e encenado em teatros do Brasil, da Bélgica e da Suécia; recebeu o prêmio "O MELHOR PARA A CRIANÇA", da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil; foi incluído na LISTA DE HONRA do IBBY (International Board on Books for Young People) e fez parte integrante da obra de Lygia que recebeu o prêmio HANS CHRISTIAN ANDERSEN e o prêmio ALMA (ASTRID LINDGREN MEMORIAL AWARD).

Sobre o livro: A imaginação da criança é a peça central da obra. Tendo ganhado de "presente"- o que na verdade era as sobras das coisas usadas da sua tia- uma grande bolsa amarela, a sonhadora Raquel guarda seus bens mais preciosos: suas vontades e um alfinete que achou na rua. Com o tempo, a turma da bolsa amarela vai crescendo e recebe um galo que não queria ser rei, outro galo muito briguento e uma guarda-chuva ( é isso mesmo, ela era menina)  que não abria nem lembrava sua história. 
Com a sutileza do olhar de uma criança, Lygia Bojunga problematiza a igualdade de genero, os direitos da criança e os sonhos, no caso, o da escrita. Primeiro, abordarei sobre o desejo de Raquel de crescer. A pequena é filha temporona, possuindo três irmãos, duas mulheres e um homem. A diferença de idade entre os irmãos é outro fator que não ajuda, enquanto Raquel está por entrar na adolescência, todos os outros já são adultos. Oras, é compreensível a pequena se sentir tão excluída de tudo, afinal, ela sempre era a criança na história. 
Depois, o segundo desejo de Raquel era de ser menino. Até ler esse livro acho que realmente nunca tinha conseguido expressar minha revolta quando ouvia coisas do tipo: Isso é coisa pra menino, rosa é cor de menina ou qualquer atitude que a nossa sociedade tenha estigmatizado referente às distinções entre gênero. Mas veja bem, Raquel não era feminista nem nada. Era só uma menina indignada com as ironias da sociedade, dentro de sua própria casa, em que seu irmão sempre podia mais. Alto lá, está dizendo que isso é regra geral? Não me interpretem mal, não foi isso que quis dizer. Até porque, anos atrás quando a obra foi escrita, o movimento feminista nem estava tão em voga assim (corrijam-me se eu estiver errada), além disso, é um livro infantil. Ou seja, são apenas as constatações de uma menina sobre a realidade.
'- Tá vendo? Falaram que tanta coisa era coisa só pra garoto, que eu acabei até pensando que o jeito era nascer garoto." BOJUNGA, Lygia.
E por último, o encantador desejo de ser escritora. Ah, esse foi o que mexeu mais comigo. Desde minha mais tenra idade gostei de inventar histórias, passei a escrever poesias aos meus 8 anos, mas admito: era um desastre. Não que hoje eu seja grande coisa. Mas voltando ao livro, Raquel queria e gostava de escrever, apenas era mal compreendida. Não tinha amigos, ninguém para ler o que escrevia e sua família só sabia tirar sarro de suas histórias. Porém, ela foi forte, não se deixou abater, o desejo de escrever falou mais alto e sua bolsa amarela seria o gancho para seus primeiros contos. Advinha só quem se animou e sentou para escrever as várias histórias que tinha na cabeça? Depois de 7 anos ainda acho que sou bem mais ou menos, mas como já dizia minha querida Raquel: "Paciência".
Com essa doçura no olhar de uma criança, repleto de fantasias e sonhos, Raquel nos traz a magia da infância e uma lição para a vida adulta. Não importa quantos anos temos, o que querem que sejamos ou o que nos impõe, é preciso ser o que somos. É isso ou carregar uma bolsa repleta de histórias e pesando como chumbo. É, eu prefiro viver cada dia de uma vez como sou do que fingir ser o que não sou. É por isso que recomendo aos altos e baixos, novos e velhos, homens e mulheres, que leiam "A Bolsa Amarela".
" Acabei até mudando de idéia: resolvi que se eu queria escrever qualquer coisa eu devia escrever e pronto. Carta, romancinho, telegrama, o que me dava na cabeça. Queriam rir de mim? Paciência. Melhor rirem de mim do que carregar aquele peso dentro da bolsa amarela." BOJUNGA, Lygia. 

domingo, 2 de outubro de 2016

Teoria dos Buracos Negros


Resultado de imagem para buraco negro foto "Já fazia algum tempo que nada mais fazia algum sentido. Trocadilho engraçado esse de “fazia”, né? Não muito, eu sei, nunca fui boa em comédia. Mas a questão era bem essa, o tempo passava e cada vez menos Melissa se encontrava. Aos poucos foi perdendo a vontade de tudo e de todos. Porque dançar na chuva se ela se molharia? Porque rir sem motivo se isso seria tolice? Porque? Porque?
Os porquês sempre vinham, mas nunca com respostas. Afinal, quem é que responderia a suas perguntas, ou melhor sua ausência de perguntas. Não havia o que perguntar, porque ela não queria mais pensar. Pensar dói às vezes, não é mesmo? Pois é, não há muito o que fazer quanto a isso. Mas pensar pode ser muito bom também, é nos momentos de mais profundos pensamentos que temos nossas grandes iluminações.
Mas deixando a parte minha filosofia de botequim, voltemos à história. Ela sentia tudo se esvaindo, alegria, animo razões e até o amor. Não havia quase nada mais nesse buraco que era o coração. Um vazio imenso e insondável, que nem ela conseguia entender. Depois que ela entrara nesse buraco negro era como se nada mais importasse, estava perdida dentro de si.
Chegava à escola, voltava, fazia suas obrigações, deixando as suas paixões e antigas alegrias de lado, já era doloroso e moroso demais fazer o que era preciso, quem diria o resto. Cada dia era uma luta constante contra si mesma. Olhava para o espelho e mal sabia quem era. Havia momentos em que só queria ser viver, mas outros... Bem, digamos que por vezes a morte lhe era bastante convidativa.
As pessoas ao seu redor percebiam que algo estava diferente, porém, não devia ser nada de mais, pensavam elas.  Ou ainda, o que fazer?- os que sabiam o que se passava. É sempre complicado lidar com a dor dos outros, afinal lidar com a nossa já é complexo, agora com a de quem se ama... Uma amálgama- vulgo mistura- de preocupações ia se formando: Até onde aquilo ia levar? Iria passar? O que fazer? Como ajudar?
Seus pais se preocupavam é claro, mas como pais pensavam- queriam acreditar- que era só adolescência. Até porque, pais sempre querem pensar o melhor, não é mesmo? E sim, ela fazia o possível para esconder.
E foi isso mesmo que ela começou a fazer, se esconder de si mesma. Ferindo a si mesma, bebendo, se isolando em uma bolha, aonde nada e ninguém poderia lhe atingir. Mas ela sabia que isso era ilusão. E sabe o que doía mais? O fato dela não saber mais o que fazer.
Foi então que naquele dia ela recebeu aquele texto para ler. Parece bobeira pensar que algo que lemos pode nos atingir tanto, mas algumas vezes atinge. Ela sentou em sua cama e chorou baixinho. Queria quebrar as paredes e barreiras que formara dentro de si, mas por onde começar?
Quando já estava de alma quase lavada teve uma brilhante ideia. Escreveu em um papel tudo aquilo que mais lhe afligia, desde bem pequena até então. Descontou suas dores e raivas naquele papel. Depois amassou bem e jogou na privada, esse era o lugar delas, no esgoto.
Sentou em sua cama e pensou “O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã”. Bem, não sabia bem como isso funcionava, seria literalmente? Então apenas desejou que isso acontecesse. Começava então a ver a luz.
Sabe, Alice caiu na Toca do Coelho escura e que parecia sem fim, mas foi assim que chegou ao País das Maravilhas. E bem, lembrando um pouco de física, o buraco negro engole tudo que vê, mas então nos leva para outra dimensão. Isto é, de acordo a teoria de nosso querido Hawking, o buraco negro pode ser uma passagem para outro universo. Pois é, talvez buracos negros tenham sua necessidade.
Talvez, na verdade, com certeza, Melissa tem sua necessidade. E ela sabe disso, sabe que a alegria virá no amanhã e que ela não deve se abater. Se ela se abstiver de suas pequenas alegrias, de sua dança, de seu jeito alegre de ser ela se perderá. E por mais que altos e baixos venham, ela sabe como é linda por dentro e por fora. E foi assim que uma estrela renasceu."
Giovana de Carvalho Florencio


O "Setembro Amarelo" já findou, mas a prevenção contra o suicídio precisa continuar o ano todo. É importante lembrar que a depressão está entre as principais causas deste. Pensado nisso escrevi esse conto contendo alguns sintomas bem claros dessa doença. Portanto, se você tem passado por alguma situação do tipo ou conhece alguém que passa, busque ajuda. Não tente enfrentar tudo sozinho. Assim como Melissa conseguiu, outras pessoas podem conseguir superar esse desafio que aflinge a tantas pessoas. A depressão é aquela doença que vai matando por dentro até que não sobra mais nada- ou como no conto, sobra apenas um buraco negro. Mas saiba, é possível superá-la, por isso é tão importante contar com a ajuda de um profissional da área e também de amigos e familiares. É válido lembrar que não apenas a depressão pode levar ao suicídio, mas outros problemas de ordem familiar, profissional e psicológica em geral. Para quem lida com alguém muito querido passando por isso, é de extrema importância saber ouvir e não julgar. Tudo que quem está passando por essa situação precisa é se sentir amado e compreendido. Se você está passando por algo do tipo. lembre-se: Você não está sozinho! Espero sinceramente que esse texto possa ajudar alguém!

Vídeo de um curta muito interessante sobre o tema: 
https://www.youtube.com/watch?v=3AYBeLj2o1M

Links interessantes:
http://oficinadepsicologia.com/depressao/suicidio
http://www.setembroamarelo.org.br/

Se precisar de ajuda, conte com o apoio da CVV( Criadora do Setembro Amarelo):
Ligue 141 ou acesse www.cvv.org.br